Em 1959, Toto Roche, diretor de provas da Fórmula 1, a fim de impedir a participação de mulheres na categoria, foi à conferência de imprensa e disse “O único capacete que uma mulher deveria utilizar é o do cabeleireiro”
Por Leticia Sá

A principal categoria do automobilismo existe desde o dia 10 de abril de 1950. Entretanto, a primeira participação feminina só ocorreu em 1958 com Maria Teresa de Filippis, corredora da Maserati na época. A pilota disputou apenas 3 Grand Prix e teve a sua participação vetada das outras corridas, pois segundo Toto Roche, diretor de provas: “o único capacete que uma mulher deveria utilizar é o do cabeleireiro”.
Após essa breve participação, a F1 só voltou a ter uma presença feminina dentro das pistas em 1974, com Lella Lombardi. Porém, desde 1992, com Giovanna Amati, não há uma mulher pilotando um carro da mais alta categoria do automobilismo. Dados apontam que dentre dos 775 pilotos que passaram pela F1, apenas 5 são mulheres. Situação alarmante considerando que não há nenhum tipo de restrição em relação a presença de pilotas no grid. Vale lembrar que apesar dos dados serem referentes a Fórmula 1, em outras categorias automobilísticas, a presença feminina também é mínima ou, até mesmo, nula. Além disso, segundo a universidade de Michigan, mulheres com até 10 anos a menos de experiência que os homens, reagiram e responderam tão bem quanto eles em relação a frequência cardíaca, a respiração e a temperatura corporal. Tendo isso em vista, surgem alguns questionamentos, como, por exemplo, “por que existe essa disparidade?”
Para responder essa pergunta, é necessário voltar um pouco à história (recente). Até o ano de 2019, a F1 era o único esporte sem nenhuma categoria feminina. Entretanto, o automobilismo vai muito além da Fórmula 1, tendo outras categorias, como a PorscheCup, a TCR, o Kart, o GT, entre outras. Porém, nem mesmo assim é possível enxergar uma grande presença feminina. Segundo o piloto da GT4, João Tesser, todas as categorias são extremamente preparadas para receber homens e mulheres. Mas, ao longo da sua passagem em 3 categorias (kart, fórmula e GT), o piloto só correu com 5 mulheres. Isso ocorre, pois o caminho, que já é difícil de se trilhar para homens, para mulheres se torna um desafio maior ainda. Ao mesmo tempo, há uma enorme falta de incentivo para praticarem esportes tidos historicamente como esportes “de homem” e ainda, uma grande dificuldade em encontrar patrocínios para conseguir se manter nesse esporte elitista. Além dessas dificuldades, segundo Felipe Barrichello: “As pilotas e pilotos brasileiros enfrentam a dificuldade de saber que, apesar da Fórmula 4 ter vindo também para o Brasil, as categorias de base do esporte estão na Europa.”

Além de adentrar no universo do automobilismo como pilota, há outras possibilidades, como, engenheira de produção, jornalista e, principalmente, fã. Porém, nem mesmo assim é possível ver uma quantidade significativa de mulheres no automobilismo. Segundo a More Than Equal, entidade fundada por David Coulthard, ex-piloto da F1, as mulheres representam 40% dos fãs da categoria. Porém, ainda assim têm que lidar com um ambiente extremamente machista, tornando assim, muito difícil manter-se encorajada.
Segundo a estudante de Jornalismo da Universidade Federal Fluminense (UFF), Sofia Tarré, é difícil se manter motivada, tendo em vista que falas como “A F1 está atraindo muitas garotas novas por causa desses pilotos jovens e bonitos” – Christian Horner, vem se tornando comuns. Ademais, apesar de ser chefe da célula de marketing da Equipe Buffalo, Rebeca White cita que é péssimo estar inserida num ambiente machista, pois as mulheres têm muito pouco poder de fala e há a necessidade de se provar para terem alguma moral.

Apesar dos desafios, há alguns sinais de mudança, como a criação da F1 Academy, categoria completamente feminina. Além disso, iniciativas como a Fórmula SAE, que oferece aos estudantes de engenharia a oportunidade de construir um veículo do tipo Fórmula pode ajudar a dar mais visibilidade feminina para a categoria. Tal iniciativa está presente na universidade mais famosa de Niterói, a UFF, com uma equipe chamada Buffalo.
Ainda segundo a chefe da célula de marketing da equipe: “nós, da Buffalo, temos estado em um patamar diferente, cada vez mais inclusivo, em parceria com a equipe Amattheis, onde eles fazem um evento só para mulheres, com o intuito de aumentar o ingresso de mulheres no mundo automobilístico. No último ano, tivemos a oportunidade de visitar a oficina deles em Petrópolis, onde este evento foi especialmente voltado para meninas da Buffalo.”

Porém, ainda há muito a se fazer, como, divulgar e mostrar que o automobilismo é lugar para mulheres, investir em categorias femininas e receber apoio daqueles que já estão no meio automobilístico.