Alô, Gragoatá!

A realidade por trás do trabalho infantil em Niterói

O aumento das crianças trabalhando nas ruas reflete em questões sociais e nas políticas públicas da cidade

Por Anna Clara Finamor 

Evasão escolar, exposição às ruas e atividades que exigem muito esforço, essa é a realidade que muitas crianças e adolescentes vivem ao redor do país. O trabalho infantil, apesar de ser proibido por lei, ainda segue sendo presente no dia a dia da população, preocupando especialistas da área da educação, assistência social e saúde. Procurando quebrar esta realidade, a cidade de Niterói continua buscando desenvolver projetos e políticas para combater estas ocorrências. 

O agravamento da vulnerabilidade socioeconômica das famílias brasileiras é um fator que colabora para o cenário do exercício de atividades feitas por menores de idade. A assistente social, Fernanda Gonçalves, que atualmente trabalha na vara da infância, juventude e idoso do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, afirma que é preciso pensar em recortes sociais para ter uma visão ampliada da problemática. 

“É preciso pensar em qual infância nós estamos falando quando se trata de trabalho infantil, a gente está falando de uma infância pobre, tem que ter o corte de classe e raça. São crianças pobres e pretas, acho que assim conseguimos entender qual o caminho”, acrescentou. 

Além disso, a dificuldade de acesso aos insumos básicos e ao poder de compra impulsionam os jovens a iniciarem trabalhos informais ou autônomos. Como expôs a assistente Fernanda, com base nas vivências do seu trabalho, as crianças e adolescentes buscam esse caminho para poder adquirir o que lhes falta. “Na minha experiência profissional, muitas das vezes não são os pais que colocam os adolescentes para trabalhar. São os próprios jovens que fazem esse movimento para consumir, um tênis, um lanche, um celular, enfim. Por que dentro das condições de vida deles não tem acesso, tem somente o básico”, completou a assistente social. 

Foto 1: Criança vendendo produto na praia 

Reprodução: Fundação Abrinq

O trabalho precoce pode causar efeitos significativos no desenvolvimento do indivíduo que ainda está em crescimento. A psicóloga educacional, Camila Resende, relata como a ausência de experiências lúdicas e de brincadeiras afetam a formação do futuro adulto que a criança terá. 

“A não vivência, ou reduzida, do lúdico, do brincar, da experiência entre pares é algo que vai fazer muita falta. […] afeta desde as dificuldades de aprendizagem até uma questão de desestímulo para o aprender, para a escolarização, para o tempo escolar que é longo e que não tem o mesmo retorno que o trabalho. Entender também que isso vai ter impacto nos relacionamentos interpessoais”, afirma a psicóloga. 

Os questionamentos que persistem quando se trata de jovens são a responsabilidade e atuação dos seus pais enquanto a sua exposição ao trabalho. A figura familiar é importante para a transmissão de segurança e afeto, mais que isso é o encarregado de cuidar e fornecer os direitos básicos. Mas como isso pode ser feito com o apoio de políticas públicas e medidas de segurança?

O Secretário de Direitos Humanos de Niterói, Rafael Adônis, explica como a cidade está destrinchando essa questão e buscando soluções: “Em Niterói já tem um trabalho de distribuição de renda, com políticas de assistência social que são fundamentais para essas famílias mais pobres que vivem nas periferias da cidade, onde os pais podem contribuir melhor para a educação dessas crianças. É uma forma também de garantir a segurança ao pai e à mãe de ter uma alimentação, um acesso à saúde, para que a criança cresça em um ambiente digno e seguro sem dificuldades”, relatou. 

Dialogando sobre o olhar de incriminar e deter os pais que não conseguem suprir as necessidades dos filhos, é preciso antes enfrentar uma visão da realidade social. Fernanda expõe sua opinião profissional sobre como isso não impede o crescimento do trabalho infantil: “Não acredito no caminho de criminalizar esses pais, pois estamos falando de negligência do Estado. Estamos falando de famílias que moram em periferias, que têm renda muito baixa, que conseguem acessar o mínimo e quando conseguem, hoje vemos muita gente passando fome. Enfim, o trabalho vira um escopo de possibilidades para essas crianças e adolescentes”, afirmou a assistente. 

Em resumo, a criação de ações que fornecem direitos fundamentais como a educação, saúde e integridade, colabora para a diminuição da estatística de crianças e jovens expostos ao trabalho infantil. É necessário que políticas públicas sejam atuantes nesse meio, respeitando sempre os recortes da sociedade.

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