O espaço já foi uma fazenda, lidou com repressão e desapropriação. Hoje, é símbolo de resistência cultural, trazendo música, culinária e história preta.
Por Francisco Campos

O Quilombo do Grotão, localizado no Parque Estadual da Serra da Tiririca, é aberto para todos os públicos, oferecendo uma rica visitação com atividades focadas na cultura preta. Rodas de samba, oficinas de percussão, capoeira e o famoso feijão na lenha compõem parte da programação, que se renova todo início de mês. No último sábado do mês, a entrada é franca.
Quem visita o local imediatamente se depara com placas que contam sobre a história de mais de 24 anos do espaço enquanto ponto de cultura, além de seus antecedentes, que têm início já após a abolição legal da escravatura. Renatão, que é hoje o maior responsável e símbolo do Quilombo do Grotão, falou em entrevista sobre as dificuldades nessa trajetória.
“A gente está aqui com uma nova vida. Na realidade, nossa vida era plantar. Meus avós vieram aqui trabalhar para a fazenda, trabalharam por 28 anos. Quando a fazenda faliu, nós ganhamos 2 alqueires e meio e 2000 mudas de banana. Produzíamos 2000kg de banana por mês. Virou parque e nós fomos desapropriados. A partir do momento que você não pode mais limpar o bananal, foi criando mato e a gente perdeu essa atividade[…]”
Renatão comenta também que o estabelecimento do Parque Estadual aconteceu sem o devido diálogo com os trabalhadores que dependiam das terras, implicando em uma luta pela sua permanência.
“Não, não teve essa troca. Eu cheguei lá, tipo assim: ‘os invasores da Serra da Tiririca’. A gente não sabia que ia vir um projeto de lei de desapropriação. Para frequentarmos todas as reuniões com as associações de condomínio, tinha que ter um CNPJ, montar nossa associação. Para ter a associação, custava dinheiro, e o feijão na lenha foi nossa fonte de renda por 3 anos para tentar conseguir a associação. Depois surgiram as propostas de fazer as rodas de samba, aí nós iniciamos essa jornada de manutenção da cultura afro”.

Hoje, o lugar conquista todos os tipos de público através das belezas da cultura afro-brasileira. O samba de fé, por exemplo, é uma roda de samba marcada por traços rítmicos e composições sobre religiões de matriz africana e suas entidades, para combater a intolerância religiosa e normalizar esses elementos diante de todos os olhares. Já o samba das mulheres é comandado por um grupo de 7 musicistas negras. Renatão acrescentou sobre a motivação desse projeto, que teve influência de Marielle Franco:
“A ideia é a gente conseguir conversar que a mulher preta não é só a cozinheira, não é só a faxineira. Esse projeto eu fiz por conta de uma pessoa que muito valorizou a gente e se interessou pela nossa história que foi a Marielle. Marielle conseguiu fazer uma emenda quando o projeto de desapropriação foi votado.”
O Quilombo do Grotão se afirma como um espaço democrático e tem a resistência cultural e ambiental como principais motivos de sua existência. A programação está sempre disponível nas redes sociais do lugar e suas atualizações constam sempre na página oficial do instagram: @quilombodogrotao.