Alô, Gragoatá!

Movimento trans rompe grades da exclusão e conquista cotas na UFF

Mobilização garante cotas trans, mas inclusão plena segue distante

Por Ana Clara Batista

Em setembro de 2024, as cotas foram aprovadas pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPEX), após diversas manifestações organizadas pela Rede Trans da universidade. Segundo a articuladora do coletivo e estudante de Pedagogia da UFF, Lua Quinellato, a vitória foi resultado de uma luta árdua. “A gente passou por um processo de enrolação por parte da reitoria”, enfatiza a estudante.

Com as dificuldades nas negociações, o movimento estudantil e a Rede Trans decidiram ocupar a reitoria da UFF, devido à falta de abertura de diálogo por parte da instituição. “Quando começamos a ocupação, é bom definir que ela foi bem insalubre. Fomos em ato à reitoria e decidimos ocupar lá. A reitoria estava toda trancada e com seguranças por todas as partes”, relata Lua Quinellato. Ela ainda expõe que houve atos de violência contra os estudantes: “Quando fomos entrar, levamos muita porrada”.

Após semanas de mobilização, os estudantes conseguiram estabelecer uma mesa de negociação, assim nasceu as cotas trans. Adicionadas às políticas de ações afirmativas da universidade. Sendo reservadas 2% das vagas para pessoas trans nos cursos de graduação, além de uma vaga extra para cada curso de pós-graduação. 

Lua relembra a sensação de viver esse momento: “Foi um sentimento incrível, após acabar a sessão, ver as pessoas chorando. Em pensar que essa luta, essa política, começou a ser construída muito antes de eu nascer. E que estou continuando os passos daquelas que passaram anos e anos lutando pelo mínimo de dignidade”.

Pessoas trans e travestis enfrentam uma realidade imposta pela sociedade que as segrega de direitos básicos como saúde, lazer, cultura e, principalmente, educação. Somente 0,02% da população trans teve acesso ao ensino superior, segundo dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). 

Ter uma política pública que assegura a entrada de toda uma comunidade nas universidades públicas é, de fato, uma conquista a ser celebrada. Entretanto, os preconceitos sociais ainda perpetuam no sentimento de pertencimento no ambiente universitário. Quando questionado sobre isso, o estudante ingressante pela cota trans, Marlon Madureira, afirma que acreditava que esse ambiente não era para ele e que a criação das cotas foi o pivô de sua mudança de pensamento.” Me sinto mais confortável no meio acadêmico por saber que existem politicas públicas que se preocupam com a nossa presença nesse ambiente”. 

Em entrevista, a coordenadora-geral do Diretório Central dos Estudantes (DCE) Fernando Santa Cruz, Gabe Moreira, informou que está em negociação com a reitoria para a realização de um mapeamento das pessoas que ingressam na UFF por meio das cotas. “A partir do diálogo com essas estudantes, queremos pensar nas políticas de forma mais participativa”, destaca a representante do DCE.

Gabe também aponta novas demandas para tornar a universidade um espaço mais acolhedor à população trans. “Uma das dificuldades que já identificávamos, tanto como Rede Trans, quanto como DCE, é a burocratização dos sistemas da UFF. Muitas vezes, não só estudantes, mas também professores e funcionários trans e travestis enfrentam dificuldades para retificar seu nome e gênero nos sistemas”, afirma.

A Universidade Federal Fluminense tem dado passos importantes rumo à inclusão, mas o caminho ainda é longo. Como lembra Gabe Moreira, coordenadora-geral do DCE, não basta garantir o acesso: é preciso construir um espaço verdadeiramente digno e respeitoso para quem sempre esteve à margem.

 Ser a primeira universidade federal do estado do Rio de Janeiro a aprovar cotas trans é um marco, mas garantir que essas pessoas permaneçam, se sintam seguras e pertencentes, é o verdadeiro desafio que se impõe agora.

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