Como o Campus de Niterói da rede incentiva o estudo e a criação em cinema, música e teatro
Por Júlia Azevedo
Fachada do Colégio Pedro II – Campus Niterói – Foto: Victória Menezes
Imagine ser um ou uma estudante do Ensino Médio. Você acaba de sair da sala de aula e pode decidir entre ir para uma experiência teatral, fazer filmes com os seus colegas de escola, tocar em uma banda ou ainda realizar todas as alternativas acima. É isso que o Colégio Pedro II – Campus Niterói, localizado no Barreto, permite atualmente com suas iniciativas culturais das Aulas de Teatro, do Cinestesia e da Banda Trama.
Com o objetivo de trazer uma educação para além da sala de aula, essas atividades organizadas pelo e para o próprio corpo acadêmico são estabelecidas por meio de didáticas que quebram as hierarquias verticais tradicionais da sala de aula, incentivando com que todos colaborem com o ensino coletivo. Já o motivo por trás de seus surgimentos é a necessidade de se implementar uma educação que valorize a expressão, a arte e o letramento midiático nos dias atuais. Como reforça a diretora pedagógica do Campus, Isabella Brasil:
“O estudante do Pedro II traz uma visão ampla do mundo, faz essa leitura de mundo de forma crítica, contextualizada e também sensível que a arte traz.“
- Banda Trama
Logo da Banda Trama – Reprodução: Instagram
A Banda Trama é um projeto de Iniciação Artística Cultural que se iniciou em 2022 por ação do professor de Música, Paulo Coutinho. É uma iniciativa que pretende incentivar a criatividade e a habilidade musical dos estudantes a partir da performance de músicas autorais ou covers. O projeto surgiu por meio da decisão do professor Paulo de montar uma atividade no qual os estudantes do segundo e terceiro ano do Ensino Médio pudessem continuar as suas práticas musicais, que acabam curricularmente no primeiro ano do E.M. dentro do ambiente escolar. Os encontros e ensaios na sala de música, um espaço recheado de instrumentos diversos, todas segundas e quartas no entre turno, têm o objetivo de criar e compor, além de executar e preparar performances que serão apresentadas futuramente.
Paulo reafirma a importância da educação musical aprofundada e contínua no desenvolvimento dos estudantes: “A partir do momento em que qualquer pessoa está inserida em um ambiente musical, ela vai ser estimulada de tal maneira que isso vai provocar uma série de processos cerebrais – a neurociência já tem estudos quanto a isso -, cognitivos, afetivos, culturais, e que tudo isso, a médio e longo prazo, estimula o sujeito a pensar a música e a arte de uma maneira mais crítica, faz com que ele olhe para o seu entorno e consiga fazer uma leitura de mundo mais crítica.”
Apesar de ter apenas 4 bolsistas atualmente – escolhidos a partir de critérios como o boletim escolar, série que cursa e a habilidade musical – qualquer estudante do Campus Niterói pode fazer parte da banda como voluntário, ter essa experiência artística e receber o certificado após cumprir uma certa carga horária no projeto. Além disso, o professor Paulo reforça que esse é um projeto permanente e retroalimentar, ou seja, à medida em que os estudantes do terceiro ano saem da escola, os alunos de outras séries, animados com a proposta e as apresentações da banda, entram e passam a contribuir com seus talentos musicais próprios.
No ano passado, a Banda Trama gravou dois singles disponíveis atualmente em plataformas de áudio, como Spotify, Youtube e Apple Music. Atualmente, duas músicas autorais se encontram em processo de gravação: “Imaturo”, composta por Ygor Macedo, e “Traços de Memória”, composta pelos estudantes Giulia Nogueira, Sabrina Ribeiro, Guilherme Chaves e Joyce Santos.
A estudante do terceiro ano e uma das compositoras, Giulia Nogueira, falou um pouco sobre o sentimento de ter uma de suas músicas gravada: “Eu nunca imaginei que eu iria escrever uma música.[…] É surreal! Eu vou ter uma música! Eu escrevi uma música, as pessoas da banda ajudaram a fazê-la. […] Eu não consigo nem expressar. É muito doido.”
Para saber mais sobre a Banda Trama siga o instagram @bandatramacp2. Para ouvi-la nas plataformas de áudio mencionadas acima é só pesquisar: Banda Trama CP2.
2. Cinestesia
Logo do Cinestesia, produzido pela ex-participante do projeto e graduanda em Cinema da UFF, Suzane Santos – Reprodução: Instagram
“[O cinema] é para aflorar intensidades no cotidiano.” A fala de Alex Cortes, professor de História no Colégio Pedro II e Bacharel em Cinema pela UFF, ressalta a importância do cinema, foco do Cinestesia, para acordar os que vivem de olhos fechados para as belezas do dia a dia. O projeto se tornou uma Iniciação Artística e Cultural por volta do ano de 2016, mas é uma iniciativa antiga dos estudantes do Campus que são amantes da sétima arte.
Com oficinas de produção audiovisual, cineclube, e aulas sobre as teorias básicas do Cinema (com exercícios como o minuto Lumière e o de Moldura), o projeto visa a democratização dos modos de produção e criação midiática e uma reflexão acerca da arte, do mundo e da vida através do Cinema.
“A molecada entra aqui [na escola] e passa a maior parte do tempo aprendendo a repetir e tem momentos de ruptura disso, sabe? São momentos de criação que a escola deixa de ser um lugar só de reprodução de conhecimentos que já existem e passa a ser um espaço de criação, de beleza e de arte.”O projeto recebeu esse nome pelos alunos a fim de evidenciar o caráter sinestésico, a capacidade de causar sensações físicas, da arte cinematográfica: “[O Cinema] não é só imagem, não é só pensamento: é físico também. Daí o nome Cinestesia [Cinema+Sinestesia]”, realça o professor.
Assim como a Banda Trama, o projeto tem bolsistas e continua aberto a todos os estudantes que quiserem participar como voluntários, com o ganho de certificado após o cumprimento de uma carga horária. Francisco Vergara, um dos 4 bolsistas, ressalta a liberdade que os estudantes dentro do Cinestesia têm no cineclube e como funciona as escolhas dos filmes a serem exibidos:
“O filme que a gente vai exibir, o horário que a gente vai exibir, o dia que a gente vai exibir, o que a gente vai fazer é sempre uma movimentação nossa [dos estudantes] para nós. […] A gente tava com uma ideia de montar amostras mensais, a partir de temas ou cineastas específicos, para ficar um pouco mais fácil de organizar e filtrar os filmes que a gente vai exibir. […] Em julho, toda quarta-feira, a gente exibia um filme dirigido por mulheres.”
Atualmente graduando em Cinema na UFF, o ex-participante do Cinestesia, Pedro Costa, conta a influência da iniciativa em sua escolha acadêmica: “Eu já sabia que queria cursar Cinema, mas o Cinestesia me auxiliou a conseguir ter uma melhor visão do Cinema e segurança na área que eu queria cursar, me apresentando novos pontos de vistas e profundidades da minha carreira.”
Para saber mais sobre o Cinestesia e suas amostras, siga a página do Instagram do projeto @coletivocinestesiacp2.
3. Aulas de Teatro
Foto do teatro do Colégio Pedro II – Campus Niterói – Foto: Victória Menezes.
No retorno às aulas presenciais após a pandemia, o professor da disciplina de Expressão Corporal do curso técnico de LIBRAS em andamento no Campus Niterói, Leonardo Bastos, recebeu um pedido dos alunos do Ensino Médio: que desse aulas de teatro a eles.
Assim surgiu a iniciativa das Aulas de Teatro, que ainda não é um Projeto de Iniciação Artística e Cultural. Com encontros às segundas e quartas, de 10h às 12h para os estudantes do turno da tarde e de 13h às 15h para os do turno da manhã, o projeto objetiva trazer um espaço de expressão artística, emocional e corporal. A ação promove estas expressividades por meio de técnicas de teatro, como o Rasaboxes, exercícios de biomecânica corporal, máscara neutra e palhaçaria, além de princípios culturais e pedagógicos:
“Eu parto dos princípios que eu construí durante a minha pós-graduação, que são os valores afro-brasileiros. Para mim, eles embasam a minha construção enquanto educador e isso serve para qualquer atividade que eu vá fazer, por exemplo, no Pedro II. Então as minhas aulas todas trabalham com circularidade, trabalham com memória, trabalham com musicalidade, corporeidade, ludicidade. […] Eu tenho uma construção muito a partir também da pedagogia do Paulo Freire e da Bell Hooks , que é a partir também do que as pessoas trazem, do outro, da escuta.”
O estudante e participante das Aulas de Teatro, Gabriel Barreto, ressalta o impacto que a iniciativa teve em sua sociabilidade: “As aulas de teatro me ajudaram muito na questão de falar em público. Antes eu tinha vergonha, não conseguia falar direito em público, e eu também falava baixo, entende? Depois que eu comecei a fazer teatro, eu aprendi melhor a lidar com esse tipo de situação, e comparado ao começo do ano, eu melhorei muito nesse quesito.”
Leonardo Bastos também destaca o fato de que, atualmente, diversos alunos com dificuldades de expressão, neurodivergentes ou com transtornos psicológicos, como ansiedade patológica ou depressão, procuram as aulas de teatro e que seria de extrema importância um auxílio psicológico para os estudantes. Apesar da necessidade, esse serviço não está disponível no Campus atualmente.
No final do ano passado, os professores Leonardo e Paulo organizaram o evento de africanidades “Vamos Kizombar”, que contou com uma apresentação performática na qual, a partir de uma roda de samba (conduzida pela Banda Trama), os atores da iniciativa de teatro contavam a história desse gênero musical. O evento também contou com apresentação de rodas de jongo, oficina de percursão, atividades de apresentação de músicas de autores negros em LIBRAS, etc. Esse ano, há a previsão de uma nova realização do evento com novas atrações no dia 29 de novembro.
Segundo a assistente em Administração do Colégio Pedro II, Ana Beatriz Carvas, a instituição conta com “um setor que é responsável pelo fomento de atividades artísticas e culturais para além do currículo escolar, que é a Coordenadoria de Cultura”. Ela é ligada à Pró-Reitoria de Pós-Graduação, Pesquisa, Extensão e Cultura, a PROPGPEC. A Banda Trama e o Cinestesia, como projetos de Iniciação Artística e Cultural, são exemplos dessas vinculações com a coordenadoria: “Os professores Paulo e Alex cadastram projetos conosco há anos.”
É importante ressaltar que a realização desses projetos só é possível devido a certos incentivos, como uma carga horária-aula que não sobrecarregue o professor – motivo destacado pelo professor Paulo Coutinho -, a disponibilização de bolsas a alunos e a possibilidade de criação de projetos institucionais que vão além da sala de aula. Também deve ser apontado o fato de que esses não são os únicos projetos dos Campus, tendo ele diversas outras iniciativas de cunho cultural e científico.