O futebol, esporte de propagação de boas ideias, também é acometido pelo conservadorismo, sendo a xenofobia um tabu pouco debatido
Por Ruann de Lima
Foto 1: Protesto contra xenofobia
Reprodução: Google Imagens
A xenofobia é um problema da realidade social, observada nas mais diversas esferas do corpo social, sendo assim, no âmbito esportivo não seria diferente. Por esse motivo, muitas vezes o esporte é usado para tentar justificar discursos xenófobos, seja com estrangeiros ou até com brasileiros que moram em regiões marginalizadas pela sociedade.
Estudantes estrangeiros da UFF, que preferiram não ter seus nomes divulgados, afirmaram que sofrem xenofobia dentro da universidade, no entanto, é apenas através do esporte que se sentem mais acolhidos. Um dos entrevistados pontuou: “pelo menos o esporte une o mundo”, contudo, declarou que o que deveria promover união, muitas vezes também segrega.
A Lei 9459, de maio de 1997, caracteriza crime o ato xenofóbico no Brasil, porém, ainda há um desconhecimento da população e das vítimas acerca do que é a xenofobia e quando ela deve ser denunciada. Por essa razão, os dados sobre essa forma de preconceito são escassos e imprecisos, seja no âmbito geral ou no esportivo.
No último dia 11 de maio, um funcionário do Bahia denunciou atos xenofóbicos promovidos por torcedores do clube paranaense Azuriz: “Baiano, não anda rápido, que você só consegue andar devagar”; “vai, macumbeiro!”; “volta para sua rede para dormir”; “volta para a Bahia, terra de índio”. Esse comportamento reflete uma realidade bastante presente contra times do nordeste, que são os principais alvos de preconceito no futebol.
Foto 2: Publicação do assessor de imprensa do Bahia
Reprodução: Twitter @brunobqueiroz
De acordo com Relatório de Descriminação Racial no Futebol, de 2018, os casos de xenofobia representam cerca de 10% de todos os ataques e preconceitos promovidos no meio esportivo. Para Marcelo Carvalho, líder do Observatório Racial Do Futebol, esse fato é negligenciado devido ao fato do tribunal desportivo nunca ter punido ninguém por atos xenofóbicos, apesar de serem classificados como crime.
Foto 3: Marcelo Carvalho do Observatório Racial no Futebol
Reprodução: Museu Do Futebol
“A partir do momento que o tribunal começar a entender isso para tirar pontos de clubes nós veremos mais casos denunciados”, ponderou. Marcelo ainda alertou o fato de que a xenofobia está, na maioria das vezes, atrelada a outros tipos de preconceitos e argumentou que os cantos homofóbicos proferidos contra gaúchos são também cantos xenófobos.
Fora do Brasil, diversos casos de racismo são relacionados à xenofobia, como o do meia brasileiro Paulo Sérgio, campeão do mundo em 1994, que enfrentou a oposição dos companheiros quando foi para o Bayer Leverkusen, da Alemanha, em 1993.
“Lembro que tinha um deles que, quando chegava perto de mim, virava e tocava a bola para outro. Não fazia isso porque era negro ou alguma coisa desse tipo, mas por ser estrangeiro e estar ocupando o espaço deles”, contou o jogador.
Muitos brasileiros quando veem ataques racistas de pessoas de outros países, são xenofóbicos e tentam validar um preconceito sobre o outro. Breiller Pires, jornalista e comentarista da ESPN, afirma que o racismo não é um preconceito menor que a xenofobia e que os ataques preconceituosos contra nortistas e nordestinos, seja dentro do esporte ou não, passa por uma falta de representatividade desses dentro da mídia: “o jornalismo é uma profissão muito elitista”, afirmou o comentarista.
Para Breiller, esse pensamento hegemônico faz-se presente no jornalismo e modifica a realidade social, visto que, diversos discursos xenófobos são reproduzidos, também, dentro da imprensa, fazendo com que esse comportamento se perpetue pela sociedade.
Essa realidade presente em todas as esferas ainda é um tabu pouco debatido, dado que, são comuns mesas redondas abordando diversas questões, mas é raro ver discussões sobre xenofobia. Uma vez que esse preconceito não é encarado como um problema, aumenta-se a dificuldade de pesquisas e mapeamentos.