Alô, Gragoatá!

Prepara Nós ME: a iniciativa estudantil que ajudou trabalhadoras a entrar na universidade

Em plena pandemia, estudantes criaram curso que ajuda trabalhadoras da UFF a entrar na universidade

Por Sara Rosário

Estudantes da Universidade Federal Fluminense, que residem na Moradia Estudantil no Gragoatá, se reuniram no período da pandemia para realizarem o pré- Enem “Prepara Nós ME” para trabalhadoras que não puderam deixar de trabalhar, mesmo com as medidas de restrição em Niterói, e tinham vontade de chegar ao ensino superior. A iniciativa de realização do projeto surgiu a partir das trocas entre os residentes da moradia estudantil, confinados devido à pandemia e a convivência com os trabalhadores que continuaram ativos no período, principalmente com as primeiras estudantes do pré: Tabata Ribeiro do Nascimento e Tairine Rocha.

As aulas dos cursos de licenciatura da UFF aconteceram de forma remota na pandemia e o Exame Nacional do Ensino Médio, principal porta de entrada dos cursos de graduação na UFF, não foi interrompido ou alterado. Italmar Lima de Vasconcellos, estudante de licenciatura em Filosofia na UFF e um dos organizadores e professores do projeto, já tinha se questionado por que as trabalhadoras de serviços gerais não ocupavam a universidade também como estudantes e como poderia realizar o estágio da licenciatura nesse período. Assim, somando a necessidade dos estudantes de realizarem a prática docente e a vontade de retomar os estudos das únicas pessoas que podiam ter contato com as medidas de enfrentamento à pandemia, os residentes da ME formados nas disciplinas das áreas do conhecimento exigidas no Enem, se mobilizaram para organizar o pré-vestibular.

Trecho do resumo do projeto. Fonte: Italmar Lima Vasconcellos

O Prepara Nós ME foi desenvolvido durante 2020, iniciando no final do mesmo ano e seguindo até às vésperas do Enem de 2021, com aulas de biologia, filosofia, literatura/português, matemática, química, física, geografia e com maior foco na redação. As estudantes foram acompanhadas pelos professores, que já as conheciam pelos espaços de convivência da ME, e por uma psicóloga com quem puderam conversar sobre os estudos, o trabalho e a vida pessoal e materna.
“A sensibilidade para saber como elas estavam a cada dia era importante, porque ainda tinha o trabalho da empresa. […] Foi longo, foi distendida essa relação”, disse Italmar.

Os professores-organizadores tiveram um olhar atento às necessidades das estudantes, considerando todas as questões que as cercavam: mulheres negras, mães e trabalhadoras durante o difícil período que foi a pandemia. Italmar ainda ressaltou que um dos pontos de destaque durante esse processo foi a sensação de comunidade na moradia. “Não é só sala de aula, é tudo ao entorno, a relação de comunidade. […] Todo mundo na vulnerabilidade tem uma relação de convergência, de apoio às pessoas que precisam. Acho que foi isso que empurrou [o projeto]. As pessoas só precisam de alguém que mostre para onde a gente pode ir.”

Tabata e Tairine, estudantes do Prepara Nós ME, realizando um simulado do Enem – Foto: Italmar Lima Vasconcellos

Tairine Rocha, estudante do curso de Desenho Industrial na UFF, falou sobre como a ideia surgiu e como foram convidadas para voltar a estudar. “Na verdade foi uma ideia que surgiu em conjunto. Estava conversando sobre isso, aí o Italmar foi organizando, conversando com os outros moradores. Eles queriam ser professores e assim nasceu o projeto.”

Tabata Ribeiro do Nascimento, estudante do curso de Sociologia na UFF, complementou: “Acho que nasceu da amizade e do respeito que eles têm com a gente aqui. E como é um lugar de gente que também como nós, pessoas em vulnerabilidade socioeconômica, acho que o pessoal teve um olhar muito carinhoso. O Italmar teve um olhar muito clínico e perguntou ‘Vamos? Vamos montar’ e vários alunos agarraram esse pedacinho de retalho e foram construindo. Estamos aqui, né?”

Sala de estudos onde eram realizadas as aulas – Foto: Sara Rosário

Com gratidão pela atenção e cuidado dos residentes, as estudantes destacaram o apoio que os professores deram a elas durante e após o período de estudos, sendo essencial para a construção da base de conteúdos para a realização do vestibular. “A galera acreditou, né? Nem a gente estava acreditando. E isso dá um gás, uma motivação, vontade de continuar. Tudo que a gente precisava, os professores vinham e nos ajudavam, sempre davam apoio.”, disse Tairine.

O Prepara Nós ME foi encerrado com o retorno das atividades presenciais dos residentes, mas há interesse de retomada. Tabata e Tairine, agora trabalhadoras e estudantes da UFF, iniciaram seus respectivos cursos em 2023.

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